Pais contadores de histórias

Pais contadores de histórias

Pais contadores de histórias

10/08/2012

Todo mundo que tem filho ou já conviveu com crianças pequenas sabe como elas gostam de histórias. Pode ser uma dessas infantis clássicas, pode ser uma de um livro conhecido, pode ser uma inventada na hora, não importa: o que importa é que a  criança sinta prazer, ria ou chore com o enredo e as personagens do conto.
E, quando uma criança gosta da história que ouviu, não dá trégua para a mãe ou para o pai: quer ouvir todas as noites e não perdoa a mínima mudança feita na história, seja por mero esquecimento, seja com o objetivo de encurtá-la devido ao cansaço do dia, por exemplo.
Não: os filhos querem ouvir a história contada do mesmo jeito, sempre. Se da primeira vez deu certo, ou seja, deu prazer, terá de ser sempre daquele jeito. Isso serve para que a criança assegure e antecipe o prazer que virá; além do mais, ajuda a criança a ter certa estabilidade e previsão sobre a vida, já que o dia dela é sempre cheio de surpresas, por mais rotineiro que seja.
E o que dizem as histórias infantis? Falam de fadas boazinhas, bruxas malvadas, mágicas e transformações, encantos e encantamentos e, principalmente, falam de um final feliz. Claro que nada disso tem a ver com “a vida como ela é” e com o jeito de ser do mundo adulto; elas dizem respeito ao mundo infantil, às fantasias da infância. Como se tornar adulta na hora certa sem passar por essa fase, sem acreditar em bruxarias, sem ter medos irracionais, sem soltar a imaginação?
Lembro-me de um pai que estava às voltas com o filho de quatro anos, que não dormia mais sozinho em seu quarto por causa do medo dos monstros que se escondiam entre as cortinas da janela. Todas as soluções práticas e adultas os pais do garoto já tinham tentado: vasculhar o quarto com a criança antes de ela ir dormir, para que ficasse provado que não havia monstro algum, tirar as cortinhas, ficar com a criança até que ela adormecesse, explicações mil de que monstros não existem, entre outras. Mas que nada! O garoto sofria e não deixava os pais dormirem por causa dos monstros noturnos que invadiam seu quarto toda santa noite. Um belo dia, o pai teve a brilhante ideia de ensinar o filho a lutar contra os monstros e a vencê-los. Deu certo! Finalmente, o pai reconheceu o mundo cheio de fantasias do filho.
Contar histórias é, principalmente, um ato de carinho por parte do adulto, que reconhece que a criança pode aprender muito, de modo lúdico e prazeroso, a respeito do mundo que a espera. Não, nem pensar que isso possa ser substituído pelo aluguel de fitas infantis na videolocadora.
Nada substitui a entonação de voz da mãe ou do pai que conta a história ao filho, os comentários que são feitos em determinados trechos, a dramatização que surge quase espontaneamente em certos episódios, o aconchego que o filho sente quando experimenta o medo ou outros afetos conflitantes estimulados pela história. É a presença de um dos pais contando a história que pode amenizar, por exemplo, determinados estereótipos e preconceitos sobre homem e mulher que frequentemente os contos infantis trazem.
Os fantásticos contos de fadas, recheados de rainhas, princesas, bruxas, príncipes e mágicas, permitem que a criança imagine e crie outras formas de viver a realidade diária da vida, o que contribui positivamente para a sua formação. Muito diferente do que promovem as “fadas”, “rainhas” e “feiticeiras” que atualmente povoam o mundo real de nossas crianças.
 
Texto retirado, com cortes, do livro “Como educar meu filho: Princípios e desafios da educação de crianças e de adolescentes hoje”, de Rosely Sayão, São Paulo, Publifolha, 2003.